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Uma oportunidade para respaldar a democracia

By Eric Farnsworth

“A comunidade internacional, principalmente o Brasil e os Estados Unidos, deve se manter vigilante para garantir a democracia no iminente processo de transição política na Venezuela,” escreve o Vice-presidente da AS/COA Eric Farnsworth para o jornal O Estado de São Paulo.

O retorno de Hugo Chávez a Cuba e sua súbita unção, no fim de semana, do vice-presidente Nicolás Maduro como seu sucessor, indicam uma transição de liderança iminente na Venezuela. Se assim for, este estaria entre os eventos hemisféricos mais importantes da década e os governos deverão se preparar para reagir de acordo.

A esta altura, a revolução bolivariana na Venezuela percorreu cerca de 14 anos, e o país foi transformado. A história julgará se a agenda de Chávez será bem-sucedida, apesar de os indicadores econômicos, os índices de criminalidade e a situação institucional da Venezuela serem problemáticos. Chávez foi repetidamente reeleito, mais recentemente, em 7 de outubro, apoiado no esforço para trazer o socialismo do século 21 para a Venezuela.

No plano internacional, Chávez certamente pôs a Venezuela no mapa. Ao mesmo tempo em que esfriava as relações com os EUA, Chávez buscou fortalecer laços com o Brasil e o Mercosul, apoiou Cuba de maneira significativa, subscreveu o projeto bolivariano em países de todo o hemisfério entre os quais Bolívia, Equador, Nicarágua e outros, e jogou um papel maior no Oriente Médio, construindo relações com Irã, Síria e outros atores e preocupações na comunidade internacional.

Sua partida causaria um forte impacto tanto na Venezuela quanto no exterior. A principal questão que se coloca é se a revolução bolivariana continuará na ausência do seu criador. Chávez é fundamental para o movimento; qualquer um que o suceda, terá dificuldade de dar continuidade à revolução sem o carisma e a base de apoio político com os quais ele conta. Assim, embora Maduro tenha recebido a indicação, não há a menor garantia de que o vice-presidente venceria a eleição que deve ser convocada 30 dias após o presidente não poder mais exercer seus deveres. Outros dentro do movimento também têm ambições de liderar o país, e os militares não devem ser desconsiderados. Aquele que conquistara presidência poderá ficar tentado a intensificar e acelerar as iniciativas ao estilo de Chávez para se mostrar digno do fundador do chavismo, trabalhando para reclamar o manto do movimento e ganhar seu respaldo político. Ao mesmo tempo, a oposição não pode ser ignorada; liderada por Henrique Capriles, ela conseguiu uma votação total mais alta, em outubro, do que seus candidatos anteriores, e suas chances continuariam a melhorar numa nova eleição em que Chávez estivesse ausente e o movimento chavista, dividido.

É precisamente por isso que a comunidade internacional deve ficar vigilante para assegurar a integridade democrática no processo de transição já em curso na Venezuela, segundo alguns observadores. É concebível crer, por exemplo, que esforços serão feitos para mudar a Constituição para que o vice-presidente assuma automaticamente a presidência sem a necessidade de eleição. É concebível também que elementos insatisfeitos das alas do partido não adeptas a Maduro busquem meios extrajudiciais para alcançar a presidência.

O papel do Brasil será crítico. Geograficamente, politicamente, e comercialmente, o Brasil mantém uma influência importante em questões venezuelanas, ainda mais agora que o Mercosul recebeu a Venezuela em seu clube. Na prática, isso significa que o Brasil deve se preparar para jogar um papel importante para garantir que a democracia se fortaleça na Venezuela quando a transição se definir e esteja disposto a defender e aplicar os princípios democráticos.

Um modo de fazê-lo poderia ser os presidentes Dilma Rousseff, Barack Obama e outros – talvez, incluindo o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, o novo presidente do México, Enrique Peña Nieto, e o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos – estarem preparados para emitir uma declaração conclamando todos os partidos da Venezuela a evitar a violência, fortalecer a governança democrática e respeitar a Constituição venezuelana no momento em que ficar claro que Chávez já não é capaz de exercer as exigências do cargo. Outros passos poderiam ser considerados. Mas ao se identificar agora, com transparência, as expectativas hemisféricas na transição venezuelana iminente, a própria democracia, mais do que qualquer indivíduo particular, seria a maior vencedora. /Tradução de Celso Paciornik

*Eric Farnsworth é vice-presidente e chefe do escritório de Washington da Americas Society/ Council of the Americas.

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