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Máquina chavista emperrou

By Eric Farnsworth

As rachaduras no movimento chavista poderão se abrir, tornando mais difícil manter unida a coalizão, escreve Eric Farnsworth para Estado de São Paulo.

As eleições de domingo deveriam ter sido a coroação de Nicolás Maduro. Ele desfrutou de todas as vantagens eleitorais. O governo gastou rios de dinheiro, nos meses anteriores ao pleito, na tentativa de convencer a população de que sua vida melhorou com o chavismo. A multidão de trabalhadores na folha de pagamento do Estado, incluindo a gigante energética PDVSA, garantiu uma forte votação em bloco em favor do governo.

Antes das eleições, os militares apoiaram abertamente Maduro, apesar da proibição constitucional de envolvimento dos membros das Forças Armadas na política, e apresentaram uma maciça evisível presença nas seções eleitorais em todo o país, ajudando ao mesmo tempo o esforço do governo para conseguir o máximo de votos.

A imprensa oficial deu a Maduro um apoio enorme, e a Capriles a menor cobertura possível, lembrando incessantemente que Chávez escolheu Maduro para ser seu sucessor. O próprio calendário eleitoral foi manipulado para que as eleições se realizassem logo após o 13 de Abril, Dia da Milícia Revolucionária Nacional, evento que garantiu uma constante cobertura para Maduro como presidente interino no papel de líder nacional, cercado pelas bandeiras, pelo povo e pela história venezuelana e driblando a proibição de fazer campanha tão perto das eleições.

A indagação de todos agora é em que isso vai dar. O país está praticamente dividido em dois, mas há fissuras também no próprio chavismo, e o presidente da Assembleia Nacional e principal rival de Maduro no chavismo, Diosdado Cabello, pediu uma profunda autocrítica depois das eleições. O chavismo, afinal, é tanto um movimento unificado quanto um amontoado de grupos de interesses díspares que Chávez conseguiu aglutinar mediante o culto da personalidade e aplicação deliberada de incentivos econômicos por apoio político. Maduro não tem a mesma personalidade, nem a mesma base política. À medida que o país despertar da loucura de gastos e as condições econômicas se agravarem, as rachaduras no movimento poderão se abrir, tornando mais difícil manter unida a coalizão chavista. Neste contexto, quem controlar as forças de segurança exercerá uma influência extremamente importante.

Um dos legados concretos que Hugo Chávez deixou à nação é que a Venezuela não tem instituições verdadeiramente independentes que possam intermediar a solução das consideráveis divergências políticas. A independência da Suprema Corte, do tribunal eleitoral nacional, do Legislativo e da imprensa foi comprometida durante os 14 anos de reinado de Chávez. Acabaram se tornando órgãos do partido.

O inesperado resultado da eleição na Venezuela e a recusa da oposição a admiti-lo dão um papel imprescindível à comunidade internacional na investigação do resultado, no empenho para impedir a violência e em favorecer a legitimidade democrática. Essa era a teoria por trás do envolvimento da Organização dos Estados Americanos (OEA) em Honduras em 2009, e naquela ocasião o Brasil teveum papel fundamental. A Venezuela e outros muito contribuíram para limitar a eficiência da OEA nas circunstâncias atuais. Outros grupos de nações não têm a competência nem, podemos dizer, a disposição para analisar objetivamente os resultados das eleições na Venezuela.

Tendo isso em mente, o Brasil, os EUA e dois ou três outros “amigos da Venezuela” deveriam avaliar a possibilidade de enviar uma delegação de alto nível para Caracas antes que as condições se agravem. Isso abriria o espaço político para o diálogo e constituiria um poderoso sinal para os venezuelanos, e para a comunidade internacional, da importância fundamental para a comunidade do hemisfério do apoio à democracia. O momento mais adequado para solucionar uma crise é antes de sua eclosão. Na Venezuela, este momento é agora.

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